terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Platônico


Todos os dias ela subia para o ônibus. Roupas leves, cabelos molhados, maquiagem fraquinha e o seu perfume – nossa, que perfume! Já havia pesquisado, era Egeo, do Boticário. Sentava-se sempre no lugar a minha frente. Seu cheiro me inebriava durante toda a viagem. Às vezes ouvia música (e cantarolava), às vezes lia, às vezes falava com a mãe ao telefone (sua voz não era aguda nem grave, nem alta nem baixa, perfeita), às vezes não fazia nada, apenas ficava vendo as ruas passarem, sem prestar atenção em nada. Às vezes (bem raro) ela chorava. Sentia vontade de encostar seu rosto no meu ombro e consolá-la “Não fique triste que esse mundo é todo seu” dizia a música, e ela é, com certeza, mais bela que qualquer camélia que eu tinha visto.

Descia sempre em frente a um prédio comercial. Fico imaginando em que ela trabalharia.

Hoje, porém, tinha um paquiderme no seu lugar. Vi quando ele entrou, quase o proíbo de sentar ali, naquele lugar sagrado, mas eu não podia fazer nada. Ela sentou lá atrás. A viagem foi quase insuportável sem o cheiro dela, imaginar que outro estava sentindo o seu perfume quando deveria ser eu.

Acalme-se, rapaz. Amanhã ela sentará no seu lugar de sempre. Você sentirá o seu perfume. O perfume que te dar forças para encarar seu duro dia.