sábado, 29 de setembro de 2007

Flores no asfalto


Caminhava em uma rua que não sei bem qual era. Não era completamente desconhecida, mas também não sabia identificar seus pontos para me localizar. Estava claro, claro como não se costuma estar nem mesmo no horário de maior sol, nem mesmo o meio dia de Belém era tão claro quanto o dia em que eu estava. Meus olhos ardiam por causa da claridade. Eu mal podia deixa-los aberto. Estava realmente muito claro. Mas ao contrario do que se imagina, não estava quente. O clima era ameno e com um vento até confortável, friozinho, gostoso. Olhei para o céu, para que algo me explicasse o que estava acontecendo, eis que não vi o sol. Ele não existia, não existia fonte de luz primaria. Nada...Era como se a luz saísse em forma de carma do corpo das pessoas e se transformasse em luz de forma uniforme. Não havia sombra. Não havia local em que a claridade estivesse menos. Era tudo claro de uma só forma. Comecei então a que questionar sobre a existência da luz. Não pode ser real essa luz, já que para existir luz é preciso haver a sombra. Só existe o claro se houver o escuro. Mas não havia.
Comecei a caminhar mais rápido, correr até, mas eu não suava. Corria mais rápido e mais rápido mas eu não sentia calor não sentia suor. Parecia que não estava fazendo esforço algum.
Comecei a procurar por pessoas, haviam muitas. Todas elas caminhavam de forma rápida, como se estivessem atrasadas para algum compromisso. Todas usavam óculos escuros e não olhavam para os lados. Ninguém andava acompanhado. Ninguém falava com ninguém. Cada um na sua direção, cada uma para o seu destino. Que eu não sabia qual era.
Paro, procuro alguém que estivesse parado. Avistei uma pessoa. Ela estava parada na beira da calçada. Olhou para o céu, consultou a hora em seu relógio. Eu me aproximei e perguntei... Gostaria de ter perguntado onde eu estava, ou porque todos agiam daquela forma, mas a única pergunta que saiu de mim foi:
- Que horas são?
A pessoa olhou para o lado, achei que fosse para mim, mas seus óculos escuros não me deixavam ver a direção do seu olhar. Voltou a olhar para frente e se lançou, se jogou na frente de um ônibus que passara. O ônibus fez daquilo que um dia eu vi que era uma pessoas, uma massa vermelha sobre o chão, que nem sei ao certo se era asfalto. O ônibus não parou, seguiu viagem.
Ninguém mais olhou. Todos seguiram seu caminho e sequer pararam para olhar o sangue. Somente eu fiquei parada olhando aquilo meio transtornada. Nunca ninguém havia feito aquilo na minha frente.
Não sei quanto tempo fiquei ali olhando o corpo. Mas houve um momento em que conseguir mudar a direção do meu olhar. Ao olhar para o lado vi, ao longe uma aglomeração de pessoas. Num surto de curiosidade fui olhar.
-O que será que aconteceu de tão bárbaro que fez com que essas pessoas mudassem seu curso?-Pensei.
Ao alcança-las, me meti em meio à multidão, afastando as pessoas querendo ver o que estava no meio, como se fosse mais que uma curiosidade, um dever.
Ao alcançar o meio, ao ver o que todos olhavam, qual não foi meu susto. Me vi lá, deitada no chão. Estava morta. Estava morta há muito tempo. Havia em mim flores, flores de todas as cores e formatos. Elas nasciam de mim. Fiquei horrorizada no primeiro momento, mas depois olhei a expressão no rosto das pessoas. Elas sorriam. Elas estavam felizes. Não sei se por minha morte ou pelas flores, que não via desde que cheguei àquele lugar.
Me senti mais calma. Me senti feliz...
Fui me afastando devagar. Estava agora eu também de óculos escuros e seguia meu caminho sem falar com ninguém somente querendo chegar ao meu destino (que eu não sabia qual era).

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Sonho Erótico

foto: Lee Stranahan
Nua em uma cama. Ao meu lado um belo homem, também nú.
Ele acaricia meu corpo com a ponta de seus dedos. Começa tocando minha boca, que abro delicadamente e beijo-os. Desce seu dedo pelo meu queixo, meu pescoço, meu colo, como quem brinca de patinar. Pousa suas mãos suavemente sobre meu seio, aperta-o primeiro suavemente, mas depois de me ouvir o gemido que emito de prazer, de ver eu mordendo meu lábio inferior, aperta-o com mais força.
Retribuo o carinho com minhas mãos passeando também pelo seu corpo. Passo por seu ombro, seu peito, sua barriga, onde faço uma pequena pausa ao perceber que ele estremecera, desço um pouco mais e para deixando-o com o gosto de quem espera por um momento maior.
Ele sorri e passa a beijar meu pescoço. Minha pele se arrepia e como reflexo eu aperto sua carne quase arrancando-a com minhas unhas. Ouço um gemido, um misto de dor e prazer que me estimula a continuar.
Ele me aperta contra si, esmagando contra seu peito meus seios. Desce seu rosto e passa a beija-los, a acaricia-los com sua língua quente, a morde-los...Uma dor grande me toma o que me faz correr com minhas unhas por toda a sua costa. Um sentido a mais, um pedido de continuação. Um passeio pelo corpo um do outro com um desejo ainda maior.
Encontro de olhares, sorriso de canto de bocas, bocas entre-abertas com respirações aceleradas. Bocas que se cerram num beijo forte e violento. Mãos que se perdem entre carícias de corpo e suores. Pernas que se confundem em um lençol branco de pureza.
E finalmente um grito; um grito emitido por ambos no momento de iniciação do fim. Eis que ele se torna parte de mim. Ele entrando em mim cada vez com mais força fazendo de mim inteira e ele, menos ele.
As mãos que ainda se movem no mesmo ritmo da dança que se formou por movimentos sincrônicos se desenvolve, e não para, e continua a se desenvolver com força e velocidade que torna cada vez mais alta a respiração e os gemidos e mais velocidade e mais força e mais velocidade e mais força e mais velocidade e mais força...
As respirações cessam. Um grito seco antes. E tudo está pronto. Uma umidade acentuada entre minhas pernas. Um sorriso bobo de satisfação. Um olhar cansado, exausto. Mais um beijo...
Boa noite.

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Em mais uma noite

Hoje foi algo mais normal.
Hoje foram as paredes se liqüefazendo, pareciam chocolate derretido.
Era algo mole, e começavam a escorrer para junto dos meus pés. Eu tentava tirar, mas não dava. Logo eu tinha parede líquida até minha cintura. Não conseguia sair por cima e quanto mais me mexia, naturalmente, mas ficava presa.
Precisava vencer o nojo, ter coragem de partir para o tudo ou nada, mergulhar e "nadar" naquele meio plasmático até sair de seu domínio. Mergulhei, não podia respirar, não podia abrir meus olhos, somente podia tentar sair pelo lado que julgava ser o menor. Ali, naquele meio misterioso, diferente, de olhos fechados, minha imaginação começou a dar conta do que eu poderia encontrar no caminho.
Rapidamente, o caminho que era para ser de somente três metros se transformou em um caminho grande, imensurável. A partir daí passo a sentir caldas acariciando meu rosto, sinto mãos estranhas me tocando, me medindo; entro em desespero.
Começo a nadar com toda a minha força, tentando me mover naquela plasma espesso, mas está cada vez mais difícil, o cansaço começa a tomar conta de mim, o ar começa a me faltar.
Minha mão que estava a frente do meu rosto pode, enfim, sentir o ar; eu havia chegado. Luto para buscar um pouco mais de força para levar meu rosto junto a minha mão. Mas as forças estão se esgotando e talvez não consiga, foi o que pensei. Morreria na beira da praia.
Minhas forças terminam, somente foi o tempo de meu nariz sair.
Todo o resto do meu corpo ainda estava dentro daquela matéria.
Meu nariz saiu, ele pode respirar. Mas estou exausta, não consigo mover nenhuma parte do meu corpo. Conseguia somente respirar.
Daí se fez necessária a paciência. Esperar que, lentamente, minhas forças fossem recuperadas para consegui sair daí. Já não tinha medo dos monstros do desconhecido, pois eu estava viva, contra todas as expectativas.
Minhas forças voltaram, e consigo sair dali, não sem grande esforço.
Estou suja, suja de uma massa sem cor definida, que vai do magenta passando pelo ciano e lembrando o amarelo. Essa massa indefinida parece querer secar em meu corpo, não deixar eu me ver livre dela. Mas me descobri forte e paciente. Ela vai sair, em sua maioria vai sair, talvez deixe ainda um pouco dentro do umbigo ou atrás da orelha, para sempre lembrar-me que sou forte quando sou paciente.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Além da Imaginação

Tem gente passando fome.
E não é a fome que você imagina
entre uma refeição e outra.
Tem gente sentindo frio.
E não é o frio que você imagina
entre o chuveiro e a toalha.
Tem gente muito doente.
E não é a doença que você imagina
entre a receita e a aspirina.
Tem gente sem esperança.
E não é o desalento que você imagina
entre o pesadelo e o despertar.
Tem gente pelos cantos.
E não são os cantos que você imagina
entre o passeio e a casa.
Tem gente sem dinheiro.
E não é a falta que você imagina
entre o presente e a mesada.
Tem gente pedindo ajuda.
E não é aquela que você imagina
entre a escola e a novela.
Tem gente que existe e parece imaginação



Ofereço ao meu amigo Allan que nunca tinha visto esse poema.

Inanimados

- Shiiiiiiiiiii, cuidado, as paredes tem ouvidos.
- Ah, se esse sofá falasse!
- Sinto, as vezes como se aquele quadro estivesse me observando.

É assim que se fala, mas hoje todas essas metáforas se fizeram reais.
O sofá começou a falar coisas absurdas, começou a me acusar. Disse que eu não respeito nada nem ninguém. Disse que viu tudo o que eu já fiz sobre ele, ou ao seu lado.
Foram tantas coisas assim?
Não lembro.
Para mim não foram tantas coisas, ou melhor, não me parece tanta coisa quando se divide tudo e se espalha por esses dois anos em que ele está presente em minha casa, em minha vida.
Mas o sofá só tem essa noite pra listar tudo o que viu, e dessa forma, juntando tudo o que ele presenciou se torna muito, até nojento. Sou uma pessoa sem nenhuma noção de moral. Estou com nojo de mim mesma quando ouço ele falar sobre mim dessa forma.
A parede então, ela já ouviu todos os meus delírios, sentiu toda a angustia que já transmiti, e foi a única a escutar minhas blasfemas. Ela conhece todos os meus segredos. Devo teme-la?
Mas por que teme-la? Não posso gostar mais dela por ela me conhecer tão bem? Por que o primeiro sentimento que vem em mim é o medo? Sinto medo daqueles que me conhecem? Medo, pois eles sabem bem onde é o meu ponto fraco e num surto de maldade eles podem me derrubar.
Mas devo aprender a confiar. Esperar sempre o melhor de todos os seres que me cercar, seja eles animados ou inanimados. E assim, quando mais tarde meu julgamento vier direi: EU CONFIEI. E estarei com minha consciência tranqüila. Sim, eu confiei.
Mas ainda há os quadros, os olhares das imagens do meu irmão, do Renato Russo, de uma pequena imagem de Jesus, eles me seguem, me vigiam. Eles não me deixam em paz.
Vejo nesse instante o Big Brother em minha casa. Ou até o panótico, não sei em que momento exatamente a tela estará ligada pro meu lado, não sei se eu estarei sendo observada nesse instante, por isso devo me comportar bem em todos os momentos.
O sofá conversa comigo, as paredes me ouvem e os quadro me vigia...E eu achando que tinha me libertado.
Onde quer que eu vá eles me olham. Tudo que está ao meu redor me observa...
Eles vão estar sempre ali...observe, sinta os olhares sobre você também.

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Febre e sonho

A febre diminui, diminui quase passando.
Ainda há delirios, mas são mais amenos.
Agora me vejo como uma espécie de Jesus Cristo, ando sobre as águas, me afasto de terra firme como se quisesse alcançar o infinito. Olho ao meu redor e só vejo água.
Uma água turva, escurecida, firme como rocha, não molha, mas sei que é água. Não sei como sei, apenas sei. Estou sobre ela.
Meus passos são longos, e cada um acontece como se eu tivesse cem metros de pernas. Mas ainda sou do mesmo tamanho. Sei porque posso me comparar com o tamanho de um pequeno barco que passa por mim.
Dentro desse barco tem um velho, ele está amarrando o que talvez seja o maior peixe que capturará na sua vida. Não sei exatamente como, mas posso ver que os tubarões vão comer esse peixe que tanto custou ao velho pescar. O tubarões vão comer, mas o velho não vai desistir e ainda vai lutar bastante até cair de cançasso e sem mais recursos.
Dou mais um passo, somente um, e o velho já está tão longe que minha vista não mais alcança.
Vejo pelo céu uma revoada de gaivotas. O velho me ensinou que isso é sinal de terra. Estou proxima da beira, talves só mais um passo e chego ao meu destino (não me lembro de ter traçado um destino).
Mas não...
Ando em direção a beira, já avisto a praia, mas não consigo alcança-la. Dou muitos passos, mas pareço não sair do lugar.
A água já não é mais tão firme. Ela agora molha. Ela está me consumindo.
Estou sendo testada. Pedro também andou pelas águas, mas teve medo e afundou.
Ele não teve fé. E nesse momento a fé parece que está me faltando, pois estou afundando. Estou com muito medo. Por mais que uma voz dentro de mim fale, calmamente, para eu não ter medo e para subir de volta a superfície...Tento confiar mas não consigo...
Continuo afundando...
Acordo.
A febre está ainda mais alta.
Minha cama está molhada de suor, da fobre, do medo, ou será a água do mar que a pouco me afogava?

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Na minha febre...

Estou com febre, delirando.
Talvez tudo ao meu redor seja um delirio. Talvez seja tudo indefinido. Um delírio.
Minha dor, meu amor.
Talvez seja tudo ilusão.
Me imagino numa cama de hospital, uma velha, em coma, que resolve fazer agora tudo que durante sua longa vida não fez. Fazer tudo ao contrario. Sou a segunda chace dela(acho que posso ser importante). Sou ilusão, e minha vida toda, esses vinte e um anos que eu considero que foram tantos, na verdade é apenas uma semana na mente dessa mulher que já está em coma por tres anos.
Quantas vidas ela é capaz de viver na sua mente até seu corpo se cansar definitivamente e partir?
Eu sou apenas uma das suas vidas.
Uma.
Um delirio de febre alta.
Minha vida acabará rápido, enquanto seus filhos e netos choram, pois ela está morrendo.
Mas ela está vivendo, vivendo mais do que eles.
Essa é a quinta vida que vive, eu sou a quinta vida dela, nesses ters anos de coma.
Ela já foi trapesista de um circo, prostituta, já foi também alguém metido a guro que não soube identificar que era somente uma projeção, foi tembém uma médica e agora ela sou eu ou eu sou ela, não sei...
ela está vivendo...
Gostaria de viver assim também, cinco vidas. Cinco vidas em uma só.
Mas sou apenas sonho, projeção...
Espero que ela fique satisfeita com meu final...
Que meu final a estimule a viver mais e mais vidas.
Ela é rica, e não sabe.

O primeiro Beijo

O que seria? Quem adivinha?

Um beijo do vampiro, ou do dragão, ou até da mulher aranha.

Um beijo.

Uma ligação, um sopro tentador. Um sorriso que ilumina, me derruba.

Apenas sonhos que se passam, talvez devaneios causados pelos muitos filmes que vi.

Filmes sobre piratas, sobre drogas, sobre alienígenas, sobre princesas que se casam com plebeus, ou plebéias que se casam com príncipes.

Ou talvez um pirata príncipe que se casa com um alienígena plebéia que usa drogas.

Muitos mitos coroaram minha adolescência.

O primeiro beijo...Esse que intimida e atrai tantas bocas inexperientes.

É apenas o seu primeiro beijo, do resto de toda sua vida.

Mas porque ser tão especial se tudo que você faz é a primeira vez do resto da sua vida.

Lembro-me de BELEZA AMERICANA: “Esse é o primeiro dia do resto da sua vida, isso vale pra todos os dias, exceto para um: o dia de sua morte”.

Mas ainda não podemos morrer, tem tantas coisas ainda que eu não fiz e sempre quis fazer.

Mas o que não imaginam é que sempre vai ter, sempre se quer adiar a morte, pois nunca se fez o suficiente.

Mas não; não se deve morrer antes de dar seu primeiro beijo, sem sentir outra pessoa bem junto de você, de uma forma que somente o primeiro beijo é capaz de permitir. Não importa se o primeiro beijo aconteceu em uma festa, com alguém que você mal conhecia. Sem que a outra pessoa soubesse, ela estava te marcando e todos os beijos seguintes serão comparados a esse que foi seu primeiro beijo.

Por isso é tão importante, por isso que tudo que nos acontece péla primeira vez é tão importante.

Todas que se seguem serão comparados a essa primeira referência.

Até mesmo o amor...

O amor, ao meu ver é o maior sentimento que você já sentiu.

Se você gosta do seu coleguinha de classe, como jamais gostou antes, isso é amor. Mas ao crescer você percebe que todas as pessoas que você se envolveu, e achou que amava, e ao conhecer uma outra pessoa, sente algo tão diferente, algo que você nunca sentiu antes, isso também é amor.

Antes não era mentira, pois antes era seu maior sentimento.

As verdades são mutáveis, nossa realidade é mutável.

Mas o beijo, o primeiro beijo, isso fica.